sábado, 19 de fevereiro de 2011

CARNAVAL EM SANTOS - 1954

Um outro cheiro forte e marcante que ficou para sempre na minha memória, foi o do estofamento de couro do Chevrolet 1954, conversível, verde, pintura metálica, do Dr. Renato, pai do Zezé e do Ná. Cançados de subir e descer a rua Augusta, resolvemos estrear com o carrão à beira-mar. Em São Paulo ele não faria o mesmo sucesso que fez em Santos, durante o Carnaval.
Alugamos um apartamento de frente pro mar e descemos a Via Anchieta, na época muito insipiente, para uma farra de arromba. Pelo menos, era o que nós achávamos. Saímos sem qualquer fantasia, pois o que queríamos era nos mostrar mesmo: Olhem, este carrão é nosso, viu? Deixamos as mochilas no apê e nos mandamos para o corso. Arriamos a capota e entramos na avenida à beira-mar, que não me lembro do nome, acho que é Praia do José Menino. Quatro gaviões paulistas: Zezé ao volante, Brandão ao lado, Renato Magro e Ná no banco de trás. E, com certeza, diversos engradados de cervejas no porta-malas. Geladas na primeira meia-hora, depois...
Usávamos, eu e o Zezé, camisas de manga bem curtinha, pois estávamos levantando uns pesos na casa dele, toda manhã, e achávamos que estávamos uns touros. O que ajudava era colocar os bíceps na porta do Chevrolet, o que aumentava a medida do músculo, que apertávamos para mostrar a musculatura. Renato Magro atrás, braços fininhos, sempre cobertos por um surrado paletó preto e o Ná, mais novo e levado, dando palpite sem parar. E o Carnaval foi esquentando. O Chevrolet foi arregimentando um verdadeiro batalhão de gatinhas santistas, o que dava um status enorme aos paulistanos. A música não sei de onde vinha, na época não existiam trios elétricos nem nada, acho que era no grito mesmo. Começamos a pular, muito exibidos, dentro, em cima e por todo do carrão, provocando um verdadeiro estrago no Chevrolet. Se fosse hoje, diria que o carrão era o bloco do abre-alas. Vinha todo mundo atrás.
E nessa farra, rasgamos a capota verde escura, novinha, amassamos o capô e o porta-malas, os outros foliões ciumentos queimaram a pintura do carro, enfim, foi um desastre, quase destruímos o carro do Dr. Renato.
Voltamos ressabiados pra São Paulo com a destruição do carro e morrendo de medo das nossas namoradas. O Zezé da Marília, eu da Eliana, irmã dela e o Renato da Salete, vizinha e amiga das duas. O Ná, livre como um pássaro, morrendo de rir.
Naquele Carnaval de 1954, tinham lançado o lança-perfume Rodouro, que povoou nossa vida de sonhos e fantasias durante muito tempo, tornando-se indispensável em todos os carnavais seguintes, até ser proibido pelo radical presidente Jânio Quadros. Dali pra frente e, clandestinamente, em todas as festinhas mais quentes, o Rodouro apagava as lembranças ruins e atiçava as boas, tornando-as ainda melhores. Fomos a diversas festas carnavalescas com o Rodouro nos bolsos. Ele era nosso estimulante, também, nas festas de formatura.
Mas, isto é uma outra história, que fica para a próxima vez.