VIAJANTE DISPLICENTE
Vai chegando o
inverno e me lembro de uma bobeira que dei numa de minhas viagens. Sempre fui
chato com minhas roupas, desde quando mamãe costurava minhas camisas.
Sentava-me ao lado dela na máquina de costura velha que havia herdado da mãe, vovó
Augusta, e ficava dando palpites: a gola tem que ser assim, as mangas podem ser
mais compridas, quero dobrá-las até os cotovelos, os botões que gosto são os de
quatro furos e assim por diante. Um chato piruando no ouvido dela até que a
camisa ficasse pronta. Coitadinha, ela ria e confirmava: você é um chato mesmo, Roberto, mas gosto de costurar pra você. Você
sabe o que quer!
Ríamos muito e eu
saía na mesma hora com a camisa nova, achando que estava abafando. Um chato
vaidoso!
Voltando ao início
da prosa do inverno: eu estava em Paris e no último dia resolvi comprar um
paletó de couro preto com bolsos, gola e punhos pespontados. O modelo estava na
minha cabeça e mamãe estava longe para me atender. Meti-me num táxi e pedi ao
motorista para me levar a uma loja de roupas de couro, antes de embarcar. Biensur monsieur, je connais tout.
Na primeira, nada
do paletó imaginado; na segunda, na décima até que, já a caminho do aeroporto, achamos mais uma loja,
e foi onde encontrei a “raridade”: napa preta, botões de osso com quatro furos,
golas pespontadas e tudo mais. Fiquei radiante! Vesti o bacana, na hora, enfiando
logo num dos bolsos dois magazines
(pentes de balas) de uma PPK, que o papai havia me encomendado. Enfim, chegamos
ao Aeroporto Charles De Gaulle, agradeci ao taxista pela paciência (os franceses
geralmente não têm nenhuma) e fui embarcar.
Como já estava
muito empacotado, camisas, blusas, capa, etc. - o frio era de 10º. C -, tirei o
paletó maravilhoso e aí, burro ou displicente, o enfiei na bagagem de mão,
despachando-a com a minha mala.
Depois de vários
whiskies, vinhos e um lauto jantar, acordei meio ressaqueado para desembarcar
no Galeão. Zonzo, cheguei à esteira de bagagens e vi a minha mala e, junto, a
sacolinha, que havia despachado em Paris quase estufando, agora estava murcha. Desapontado,
imaginei a cena: o carregador de bagagens percebendo a gordura da sacolinha
pensou, deve ter coisa boa aí. Destrancada, foi fácil tirar o maravilhoso
paletó, vesti-lo e desfilar poderoso pelos salões do Galeão.
Fica a advertência:
nunca despache malas/sacolas sem trancas ou cadeados, elas sempre voltam
vazias. (Foto Google)
FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
“A
valsa e o vinho sempre pedem bis.” Joahann Strauss (1825-1899)