terça-feira, 30 de abril de 2013

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AMOR PLATÔNICO
Colegas de Faculdade, os dois subiam a Rua São Sebastião praticamente à mesma hora.  Parecia coincidência e era mesmo. Uma rotina que durou quase cinco anos de faculdade.
Ela, filha dos donos de uma livraria no meio do quarteirão, era quem, sozinha, fechava as portas de ferro pesadas, pois os pais encerravam o expediente sempre às dezoito horas.
Ele morava no prédio em frente à livraria e, usualmente, às dezenove horas, saía para ir à faculdade. Era quando ela, ardilosa, encerrava as portas do estabelecimento. Golpe da fãzinha do colega de turma.
Assim, subiam a rua conversando. Ela gostava de ouvir o que ele contava sobre suas viagens. Sempre uma história nova, com lembranças das peripécias que havia aprontado nas ilhas Caribeñas ou nos Estados Unidos, para onde ganhara uma bolsa de estudos.
Na época das provas finais do curso – ano da formatura -, ela o convidou para estudarem juntos para os exames, pois era grande o volume de matérias e, se um ajudasse o outro, poderiam ter um resultado melhor. Assim, marcaram para começar os estudos um dia antes de cada prova. Eles usariam o acervo da livraria para consulta, já que ele não tinha todos os livros adotados pela escola, e agora não precisaria comprar nenhum. Além do mais, andava sempre liso. Do que recebia das aulas de violão não sobrava nada para os livros universitários. O total era empregado nas cervejas e nos chopes das noites boêmias com os amigos. E eram quase todas elas dedicadas às serenatas sem fim. Assim, nos dias combinados, ele atravessava a rua lá pelas cinco da tarde. Com uma biblioteca inteira disponível para consultas, os dois iam para uma sala no fundo da livraria e repassavam as lições com rapidez. Ocupando a mesma escrivaninha, um de frente do outro, eles estudavam, realmente, arguindo-se mutuamente cada ponto das matérias indicadas. Após cada prova, a nota era divulgada e eles foram constatando ótima pontuação, bem acima da média, o que os deixava radiantes, pois se formariam sem precisar de segunda época, que era a chance de fazer outra prova para alcançar a média necessária para passar de ano ou, no caso deles, para encerrar o curso.
No dia da última prova, estavam os dois cumprindo a mesma rotina e ela parecia muito aflita.  Afinal aqueles momentos a sós com ele, num total isolamento do mundo, iriam acabar. Embora não se tocassem, não namorassem... nada, só estudassem, para ela era uma curtição íntima estar a sós com ele, fechados naquela salinha.
Naquele dia, última tarde de estudos, ele curtia uma ressaca muito forte, estava com dores no corpo, os olhos cansados e preguiçosos e sem nenhuma vontade de estudar, louco para ir embora. Ela, para animá-lo, propôs uma massagem nos ombros e nas costas para relaxar. Ele topou. Ela se levantou e começou a massagem com vigor e dedicação. Na verdade, era um carinho de amor contido que ela programara para uma daquelas tardes, depois que os pais fossem embora. Um sonho planejado. Massagem vai, massagem vem e ela foi-se entusiasmando. Estava muito quente. Ela desabotoou e abriu a blusinha. Ele de olhos fechados e de costas, não viu a cena. O calor aumentou, ela tirou o soutien e a blusa e jogou no chão ao lado da mesa. Ele, sentindo-se nas nuvens, só falava Está ótimo, que delícia! Com uma das mãos ela tirou os jeans e também o jogou no chão, junto com a calcinha. E ele sonhando, relaxando... quando, de repente, levanta-se abruptamente e se encaminha para a porta, lembrando que estava com o carro do pai e que tinha hora para buscá-lo em seu trabalho. Ela nua e assustada, se agacha e enfia-se debaixo da escrivaninha. Quando ele se volta para despedir, não a vendo, pergunta intrigado: Cadê você? Ela põe a cabeça no tampo da mesa: Estou pegando os livros que ficaram aqui no chão. E se enfia de novo no esconderijo da mesa. Ciao! Mas ele se volta e se aproxima curioso, dá uma olhada, vê as roupinhas dela no chão, dá um sorriso. O pai que pegue um táxi. Volta e tranca a porta por dentro.
Belo Horizonte, abril /2013

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
Narcisista é alguém mais bonito do que a gente. Gore Vidal