A historinha da minha avó, me fez lembrar dos bichos que tínhamos, quando morávamos com ela, vovó Augusta, mãe da mamãe. A Lúcia não era muito ligada nesse negócio de criação, mas ficou encarregada de cuidar do Louro, um papagaio falante, que ficava dependurado numa coluna ao lado do quaradouro de roupas, logo na porta de saída para o quintal. Ele gostava muito de banana colhida na touceira, no fundo do lote, e de mexerica.
O quintal era pequeno, mas nele havia ainda dois pés de laranja, dois de limão - galego e Taiti -, um abacateiro alto, uma caramboleira, mamões, macho e fêmea, além de uma horta com chuchu, cará, tomates, alface, espinafre, salsa e cebolinha. Um verdadeiro armazém de frutas, legumes e folhas frescas. Ainda cabiam nesse pequeno lote, dois orquidários, um de cada tio, José e Tonico.
Voltando aos bichos, eu tinha um cachorro, vira-lata puríssimo, que eu chamava de Jipe. Minha avó tinha um gato, o Sargento. Nas patinhas ele tinha as três divisas características da patente dos sargentos. E tínhamos também a já citada Bobina, nosso mico-estrela baiano, que encantou a nossa vida. Ela vivia praticamente solta, subindo em árvores, correndo pelo quintal e, quando chegávamos do Grupo Escolar, pulava nos nossos colos e ombros. Lembro-me de que uma vez ela estava no meu ombro e quando fui tirá-la, ficou com tanta raiva que deu uma mordida minha orelha com uns dentinhos tão finos, que quase arrancou um pedaço. Fiquei uma semana com a orelha embrulhada num esparadrapo, contando a proeza para os meus amigos e colegas.
Naquela época, corria pela cidade a carrocinha da Prefeitura, que era um pequeno furgão, com dois algozes catadores de cachorros de rua. Sorrateiros, subiam a Rua Bernardo Guimarães em silêncio e laçando todos os cachorros que encontravam. Tínhamos horror a que pegassem o Jipe, que brincava também muito solto, dentro e fora de casa. Contavam que os cachorros recolhidos eram levados para o Perrela, onde eram mortos e viravam sabão. Nós morríamos de medo dos homens da carrocinha.Uma vez, levaram o cachorro do meu amigo Décio, apelidado Destão Cabeçudo, que morava na esquina. Foi uma tristeza saber que ele tinha virado sabão.
Ah! E em meio a essa bicharada, houve uma arara linda, azul e vermelha, também trazida pelo primo Milton, aquele que era piloto. Mas, ela voou para o quintal e, de lá, desapareceu.
Depois dessa convivência zoológica, em Belo Horizonte , nos mudamos para São Paulo. Papai havia sido convidado parta lecionar Microbiologia e Medicina Preventiva na Faculdade de Higiene e Saúde Pública da USP, no bairro Pinheiros, na Capital. Fomos morar num apartamento pequeno, de número 2, na Rua Teodoro Sampaio, 316, esquina da Rua Arruda Alvim, onde nunca conseguimos criar nem uma cobaia. Papai as tinha de sobra na Faculdade. Alguns anos depois, quando nos mudamos para um apartamento maior, o de número 6, no mesmo prédio, mamãe resolveu adotar um cachorrinho pequenez, que nos acompanhou por mais de quinze anos. O nome dele era Kito. Peludo, branco e marrom, e muito brincalhão e viajou muito conosco, de São Paulo para Belo Horizonte e depois para Ribeirão Preto, onde entrou para a história.