sexta-feira, 20 de maio de 2011

MIDNIGHT SINGER - 2º. CAPÍTULO

De Boston, Massachussets, nós bolsistas do Experiment in International Living  partimos para Putney, Vermont, para uma avaliação daquela etapa da viagem, depois da permanência nas casas de famílias americanas em Chicago, Illinois. Nessa estação de férias de inverno, completamente congelada, passaríamos dez dias participando de seminários, palestras e encontros com os dirigentes do programa. Naquela data, março de 1965, havia 742 estudantes estrangeiros em visita aos Estados Unidos. Assim, acabamos conhecendo gente do mundo todo. Entre os que me lembro: chineses, japoneses, húngaros, hindus, sul-africanos, bolivianos, franceses, ingleses, congoleses, argentinos e mais outros tantos brasileiros.
Para as três últimas noites no hotel, a organização do programa preparou uma apresentação dos próprios estudantes sobre seus respectivos países e nos deu meia hora para falar sobre o Brasil.
É curioso que nenhum dos colegas estrangeiros, que encontrávamos pelos corredores e com quem batíamos um papinho, conhecia o Brasil e muito menos sabia onde ficava. Nem um! Zero. Assim, nossa apresentação criou uma expectativa muito grande. Éramos aves raríssimas num universo de línguas, trajes, turbantes, cores e tipos; todos menos raros do que nós.
Depois de uma reunião regada a muito café ralo, decidimos pelo nosso roteiro. Os candidatos a embaixadores brilharam, pois conheciam o Brasil com detalhes: nossa geografia, história, costumes, tudo enfim, e me escalaram para intercalar a palestra com apresentação de músicas brasileiras.
Lembro-me de que me sentei no espaldar de uma cadeira, coloquei uma garrafa térmica no assento, e eles, narradores, começaram assim: “O Brasil é um país localizado na América do Sul, uma daquelas Américas descobertas por Cristóvão Colombo, com a maior área geográfica do hemisfério sul. É do tamanho dos Estados Unidos, sem o Texas.’’
Os gringos, com certeza surpresos, pensaram: Um país desse tamanho e nós nunca ouvimos falar?! Oportunamente, em seguida, toquei a música “Garota de Ipanema”, então recém-lançada pelo Tom Jobim, no Carnegie Hall, em New York, cantando junto com Frank Sinatra. Foi um estouro.  O queixo deles caiu.
Voltaram os locutores diplomáticos e continuaram a fazer as comparações, para eles, cada vez mais assustadoras: “O Brasil tem 21 estados”. O quê?! “Tem a maior extensão de praias das Américas”. Heim?! Soltei o “Samba de uma Nota Só”, também já lançado lá. Vibraram. E assim foi indo a apresentação que, ao final, me deixava com dez minutos para encerrá-la só tocando e cantando. Um sucesso!
Não me deixaram sair do palco para a apresentação da China. Recomecei com “Berimbau”, “Canto de Ossanha”, “Consolação”, “Só danço Samba”, “Aquarela do Brasil”, enfim, todo o meu repertório tocado e cantado. Encerrei minha participação, três horas depois, com o “Samba da Benção”, numa versão em inglês, que havia escrito, ainda em Highland Park, para não cansar a platéia com o português. Começava assim: It´s better to be happy than be said happiness is the best thing that there is, it´s like the word that makes the life so glad. But when you are a little sadness, don´t worry I’ll be around together, to give you more and more, much more than you ever had…God bless…E fui abençoando todo mundo. A cada bênção, um delírio diferente. Como os povos são mesmo diferentes nas suas reações de alegria. Fui ovacionado, de pé, pela platéia delirante durante longos minutos. Só dei conta porque havia comprado uma garrafa de Jack Daniels na cidade vizinha - Putney was a dry city, não vendia bebidas alcoólicas. Algumas cidades americanas ainda têm esta proibição. Coisas da “Lei Seca”.  Na garrafa térmica, aquela já citada acima, havia entornado o precioso líquido do JD que eu ficava tomando como se estivesse limpando a garganta com café.
Mentira! Estava era enchendo a cara com o delicioso Bourbon americano.
Também, com aquele frio e um violão novinho!