terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

UM JATOBÁ CENTENÁRIO
Numa bela manhã de outono, céu azul brilhando, o Zuza jogou as selas em dois cavalos e chamou o Caio, seu filho, para dar uma volta na Fazenda Boa Esperança, em Santa Luzia. Eles estavam passando uns dias no sítio dele, que ficava situado dentro da bela fazenda, e haviam resolvido caçar patos na lagoa do Zé Dias, para o almoço.
A fazenda era cheia de lugares pitorescos, onde os cavaleiros, normalmente, encontravam cavas com peças antigas de artesanato indígena, protegidas por enormes emaranhados de teias de aranhas. Seguindo pela beira-rio, cheia de atoleiros, os cavalos enterravam as patas até os joelhos na terra lavrada por uma draga de ouro que corria ao longo de todo o limite da fazenda com o Rio das Velhas. Embrenhavam-se em matas fechadas com enorme variedade de macacos e micos saltitantes nas suas ramagens e, às vezes, topavam com uma onça pintada escondida numa toca, até descansarem à sombra do belo jatobá centenário, relíquia da natureza local.
Com os cavalos já atrelados, Caio, ainda menino, montou com dificuldade a Diana, uma égua alta e esguia, e o Zuza armou e colocou a cartucheira na sela; na bainha, um revólver para qualquer escaramuça ao longo do caminho, montando o Garcez, premiado mangalarga marchador. E lá se foram os dois até ficarem montados e de prontidão ao pé da lagoa, aguardando a revoada dos patos para acertar a primeira vítima.
No início do voo, o Zuza sapecou um tirambaço de cartucheira no grupo em revoada, acertando um deles que desceu de bico para o chão. Em seguida, olhou sugestivamente para o Caio, apontando o pato abatido, para que ele desmontasse e fosse buscá-lo.
O Caio, obediente, saltou da égua e foi apanhar o pato, quando, repentinamente, do alto do morro, desce um velho montado numa mula ordenando ao cachorro dele:  “Pega ele, Cão”. O Zuza armou a cartucheira e apontou para o cachorro. O velho, num relance, desembainhou o revólver e apontou para a cabeça do Zuza, dizendo: “Se atirar no Cão, eu mato o senhor. Para, Cão.” O cachorro obedeceu, o Caio pegou o patinho, montou na égua e os dois foram embora, no passo,  olhando desconfiados para o ermitão, que morava numa cabana ao lado do jatobá centenário.
Algumas semanas depois, souberam que o velho havia sumido e, talvez por vingança, teria cortado o maravilhoso jatobá, que apareceu tombado na terra.
Belo Horizonte, fevereiro de 2013.

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
O que se opõe à fé não é o ateísmo, é o medo. Leonardo Boff