sábado, 20 de outubro de 2012

La Veuve Joyeuse et moi
Pelo título, vocês já perceberam que acabei de sair do Palácio das Artes, depois de assistir, encantado, uma belíssima versão da Viúva Alegre, esta personagem que habitou  minha vida durante muitos anos, principalmente enquanto morava com o papai, verdadeiro apaixonado pela história e pela maravilhosa música, criadas pelo gênio de Franz Lehár.
Contar que fui assistir à peça é pouco, porque em alguns momentos derramei uma silenciosa lágrima, daquelas que só saem quando apertamos o coração para arrancar lá do fundo um choro contido pelo tempo e pelas barreiras dos sentimentos represados.
E aquela lágrima veio trazendo as boas lembranças de um momento único e feliz  quando numa noite, a Lúcia e eu, em pleno rock`n roll, ouvimos do papai, quando chegou, o único pedido jamais feito a nós, para tocar uma música. Disse ele: “Por favor, meninos, estou com muita vontade de ouvir A Viúva Alegre. Vamos ouvi-la?”
Interrompemos a cantoria e, na velha vitrola do nosso apartamento da Rua Teodoro Sampaio, em São Paulo, rodamos o disco para ele que, assentou-se no sofá em frente e, com os olhos cheios d`água ouviu a peça até o final. Em completo silêncio!
Para nós, foi uma oportunidade única, pois, pudemos compartilhar com ele, de um instante de total desligamento da vida dos micróbios e das bactérias, para render-se à beleza da música que tanto amava.  
E hoje, na platéia do teatro senti as almas deles ali presentes, a dele e a da Lúcia juntas comigo, a cada hora em que la Veuve Joyeuse aparecia no palco. Foi delicioso o nosso encontro.
Reparem que estou insistindo no nome em francês, pois a peça cantada em português foi  o único incômodo que senti durante todo o espetáculo. A tradução para o português, embora ótima e tendo sido versada pelo insuperável Millôr Fernandes, desviou minha concentração para  procurar entender os diálogos cantados e ofuscou minha atenção quanto aos lindíssimos figurinos, os comportados cenários em art-deco ressaltados por uma iluminação perfeita, os figurinos bem cortados, os excelentes solistas, o Coral Lírico de Minas Gerais e o Ballet Jovem do Palácio das Artes, todos muito bem interpretados sob a regência firme  do maestro Silvio Viegas à frente da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, afinadíssimos com a grandiosidade do espetáculo.
Parabéns e muito obrigado à direção da Fundação Clóvis Salgado.
Não percam.
Belo Horizonte, outubro de 2012.

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
A fidelidade devia ser facultativa. Nelson Rodrigues (1912-1980)