terça-feira, 16 de julho de 2013


BOSSA NOVA NO CARIBE
De Miami a Nassau foi apenas uma hora de vôo. Desembarquei, naquela manhã chuvosa de domingo, somente com o telefone da empresa do meu amigo Peter Lesley, pois não tinha nem o telefone da casa dele. Nós, passageiros, fomos recebidos ao som da banda do Blind Blake Trio, tocando a famosa Bye, Bye Black Bird, quase um hino oficial das ilhas inglesas.
Levava comigo um violão, presente do Zuza para a Jean, esposa do Peter, que estava iniciando o aprendizado do instrumento. Os violões acústicos brasileiros já eram de ótima qualidade, mesmo os construídos em escala industrial como aquele Di Giorgio.
Telefonei para a firma do Peter que, naturalmente, estava fechada. Eles também não trabalham aos domingos. Sentei-me, então, junto ao balcão de um bar do aeroporto para tomar uma cerveja e pensar como fazer para localizar o meu amigo. Enquanto isso continuaria ouvindo as agradáveis baladas do conjunto musical local.
Ah, justamente por estar portando o violão, fui inquirido pelo fiscal da alfândega. Ele queria saber se eu era músico e, diante da minha afirmativa, pediu-me para tocar somente uma música para se certificar de que aquele era o meu instrumento de trabalho e não algum contrabando para ganhar uns trocados na ilha. Esta prática foi muito usada naquela região onde, durante séculos, aventureiros aportavam para vender alguma muamba ou fazer um negocinho ilícito. O Caribe ficou marcado com a fama de terra de piratas e bandoleiros que o usavam como rota de passagem para os continentes americanos. E os ranços daquela época ainda influenciavam os fiscais da Aduana.
Toquei logo um solo da Garota de Ipanema, que já havia sido lançada nos Estados Unidos, há alguns meses, no grande show de Bossa Nova apresentado no Carneggie Hall, em New York. Os assistentes gostaram tanto que pediram bis. Toquei também o Samba de Uma Nota Só e Desafinado, que também haviam sido apresentadas em NY e, talvez, já fossem conhecidas naquelas placas.
Convencido, o fiscal aduaneiro liberou-me e fui tomar a tal cerveja no bar.
Aí, aconteceu uma ótima. O chefe da banda local, o cego Blake, sentou-se ao meu lado, me cumprimentou pela pequena apresentação para a Aduana e, depois de uns drinques, convidou-me para tocar alguma coisa com o trio.
Claro – falei -, enquanto isto você me ajuda a encontrar o telefone do meu amigo Peter, está bem? Ele concordou e me deixou tocando com a banda enquanto iniciava uma pesquisa nos catálogos telefônicos e com os conhecidos das lojas instaladas no aeroporto. Toquei com eles umas três ou quatro músicas até que o velho cego voltou radiante com o número do telefone nas mãos.
Nossa apresentação musical foi um improviso muito estranho, pois os dois músicos -  um contrabaixista e um baterista - nada conheciam do novo ritmo, a bossa nova. O ano era 1967 e não havia divulgação da música brasileira fora do Brasil, muito menos qualquer gravação disponível. Tenho certeza de que foi a primeira apresentação do novo estilo no Arquipélago das Bahamas. E valeu, pois consegui o telefone do Peter, tomei umas cervejas e uns snaks for free e fui muito aplaudido o que é, sempre, um prêmio para o jovem artista. Thanks Bahamians.
Belo Horizonte, julho 2013.

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
Quem tem amor e tem calma
Tem calma, não tem amor
Adelmar Tavares