GINCANA EM
RIBEIRÃO QUE ACABOU NA PRAIA GRANDE
Lembrei-me de uma
ótima história acontecida nos anos 1960, ainda em Ribeirão Preto.
Numa tardinha sem
qualquer perspectiva tocou a campainha lá de casa e era o Luiz Roberto Leitão
Teixeira, amigo paulista que havia conhecido em
Belo Horizonte.
O Luiz era um
paulistão típico. Era porque nunca mais tive notícia dele e não sei, portanto,
se ele mudou nalguma coisa. Ele sempre foi um pouco exibicionista, pois, era
conceituado como um grande talento para as operações financeiras e, assim,
ficou meio metidinho. Nunca me importei com estas presunções passageiras e
convivemos muito bem.
Depois que me mudei
para Ribeirão, de vez em quando ele aparecia para um chope no Pinguim, um bate
papo animado sobre carros, meninas, etc. Foi um bom companheiro.
Pois é, naquela
tardinha apareceu o Luiz cheio de planos. Eu havia contado a ele sobre uma
gincana que o pessoal de Ribeirão estava organizando e ele resolveu participar.
Alugou um fusquinha em Sampa e se mandou pra terrinha.
Ele não se hospedava
lá em casa. Não cabia! Meu quartinho só tinha um sofá
de dia que virava cama de noite. Não tinha nem armário, só o violão e um
gravador numa mesica ao lado da cama onde eu escutava, toda noite, as melhores
do festival de San Remo de 1963. Músicas maravilhosas que eu canto até hoje: Al
di La, Il Nostro Concerto, Legatta a um Granello di Sábia, Arrivederci e muitas
outras.
Tempo bom aquele...
Assim, alugamos um
Fusca e o Luiz, Lúcia e eu formamos uma equipe para disputar a ginkana, que
constava DCE uma série de tarefas a serem executadas nuns limites de tempo que,
quem fizesse o melhor tempo, ganharia. Na verdade, era uma grande farra para
movimentar o fim de semana na, ainda pacata, cidade da cerveja. Nossa
classificação foi ridícula, embora tivéssemos cumprido todas as ordens. É que a
gente dividia as tarefas com uns copos de chopes o que, sempre, atrasava alguns
minutos. Uma irresponsabilidadezinha, felizmente, sem consequências.
Mas, deste encontro
de brincadeiras, eu e ele combinamos de ir para São Paulo no final da semana
seguinte, pois, o Luiz havia conhecido umas alunas do Dês Oiseau, colégio
chique de São Paulo e queria me apresentar para a turma.
Ele passou lá em
casa na sexta de manhã e partimos para São Paulo, sacolinha forrada de maços de
cigarros, um calção, sei lá porquê, e umas roupinhas leves.
Ele dirigia muito
bem e, de fusquinha, fomos em três horas da porta lá de casa até a casa dele em São Paulo. Ele ligou o carro, enfiou o pé no
acelerador e só o tirou quando estacionamos na garagem da casa dele no Ibirapuera.
Trezentos e trinta quilômetros só de estrada. Um recorde!
Falei – “Você é um
ótimo piloto. De fusquinha com o pé no talo, fizemos a viagem em pouco mais de
três horas.” Ele sorriu e me olhou com uns olhos azuis de gozação: “Você sentiu
algum medo? Não, porquê? Olha aqui.” Pisou no freio que foi até o fundo. Não
tínhamos nada de freio. Zero freio. Sorriu de novo e falou. “Fizemos em três
horas porque eu não tinha freios. Se tivesse...”
Tirei minha sacola
do carro e entramos na casa dele. Nothing
to say.
A família dele
era muito organizada e disciplinada. O pai, senhor pai de cinco filhos homens,
cuidava de todas as informações para o dia-a-dia dos filhos. Os ônibus vão
mudar de itinerário, as ruas x e y mudaram de mão, estão tirando os bondes da Teodoro
Sampaio, vocês tem que sair mais cedo, etc., etc. Um verdadeiro paizão. A mãe,
menos impositiva, cuidava bem da casa e da cozinha.
Era uma ótima
cozinheira. Preparou um Cuzcuz Paulista inesquecível.
Não sei como as
meninas do rigoroso colégio conseguiram sair. Acho que fugiram, mas estavam,
pontualmente, na esquina da Av. Angélica, esperando por nós às 8 da manhã.
Entre sete e oito
horas, consertamos o freio da máquina numa oficina de um amigo do Luiz, na
esquina da casa dele. Era o “burrinho”que estava com um vazamento.
Como o programa não
havia sido combinado e não sabíamos o que elas topariam fazer, levamos calções,
camisetas e roupas de praia para convidá-las para o fim de semana em Santos. Elaseram muito chiques...e, talvez,
estivessem esperando um programa mais sofisticado, sei lá, em vez de Santos ir
para o Guarujá ou nada disso, só dar uma volta e almoçar num restaurante
bacana. Uma incógnita. Nos Estados Unidos eles chamam esses encontros de Blind Date, com razào.
E o encontro deu
certo. Convidamos para o fim de semana em Santos e as disseram, uníssono,
dormiremos em quartos separados, está bem? Claro, quem poderia pensar de outra
forma?
Dois rapazes
sedentos de amor e duas quase freiras, também sedentas mas muito comportadas?
E o amor pegou fogo!
Descemos a Via
Anchieta comportadamente a 80
km/h, sem qualquer risco, num dia chuvoso, cinza, sem nenhuma graça. Em Santos,
decidimos seguir para a Praia Grande, na época inóspita e com muito mais
chances de um programinha livre. Sem espectadores nem famílias controladoras.
Paramos numa região sem condomínios, bem vazia, e trocamos de roupa atrás do
fusquinha, com o maior pudor. Delas, naturalmente!
E fomos nadar.
Correr na praia suja e de areia cinza. Sem nenhuma graça. Uma delas perguntou:
“Vocês trouxeram alguma coisa pra beber?” Olhei pro Luiz e ele entendeu. As
meninas estão animadas, querendo uma aventura mais excitante...
Que ótimo! Tínhamos
trazido uma garrafa de vodca escondida debaixo do banco do fusquinha pra não
assustar as meninas e eram elas que estavam botando fogo no programa. Abrimos a
vodca quentíssima, sem gosto como qualquer outra e resolvemos fazer um
piquenique.
E a festa começou!
Tudo que era puro e inocente, só na nossa cabeça, claro, na minha e na do Luiz,
virou uma grande farra. As meninas resolveram fazer um topless só pra mostrar os peitinhos porque
não tinha nem sol...
E aí foi um tal de
rolar na areia grossa e suja da Praia Grande até cair a noite.
E agora? Onde vamos
dormir? Uma delas sugeriu: “Eu durmo com o Luiz no fusquinha e vocês buscam um
canto aí na praia. Ela é
grande, não é?”Brincou.
Foi minha primeira
vez sob as estrelas do litoral. Acabei dormindo em muitas outras, aqui e
alhures: Ubatuba, Ilha Bela, Puerto Plata na República Dominicana e Tobago, no Caribe. Sobre a noite na
Dominica já escrevi relatando a mais bela visão da Via Láctea que já tive. Só
ali, compreendi a dimensão do universo...
Voltando à Praia
Grande, hoje um município independente no litoral Santista, conseguimos um belo
refúgio no meio da areia e das graminhas que separam a praia do mato. Foi bom.
Muito bom.
Aquelas meninas do
Dês Oiseau eram muito levadas.
Foto Google
FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
“O problema do Brasil não é a
Monarquia nem a República.
É a oligarquia absoluta.” Machado de Assis no final do Século XIX.