segunda-feira, 4 de novembro de 2013


A MÃE RAPTADA

Com um mal-estar súbito, a mãe deles foi internada num ótimo hospital onde conheciam o diretor-clínico. Com esta facilidade, conseguiram a internação sem maiores burocracias, pois uma vaga hospitalar em Belo Horizonte, na época, era coisa raríssima.  A senhora foi muito bem assistida, exames clínicos e laboratoriais imediatamente aplicados e o diagnóstico: pneumonia tripla.

O velho diretor aconselhou aos rapazes: Não se preocupem, vai ficar tudo bem aqui no hospital. Repouso obrigatório, alimentação balanceada e medicação correta, com uns dez dias ela terá alta. Os dois irmãos ficaram mais ou menos calmos porque o Natal estava chegando e seria uma lástima não ter a mãe em casa para as comemorações. Era ela quem preparava tudo: a ceia, as brincadeiras com os presentes, regia a cantoria, enfim, era a figura central e mais importante na modesta casa na Floresta. Mas ela vai ficar sozinha?- perguntaram.

O plano dela não autorizava um acompanhante e, conformados, os filhos foram embora. Saíram pensativos, se entreolhando e maquinando alguma ideia para raptar a mãe e levá-la para casa a tempo do Natal. Não deu outra. Marcaram para o dia seguinte, depois das oito da noite na porta do fundo do hospital, os dois de branco. Encontraram-se como o combinado e formularam o rapto.

Marcaram para o dia seguinte, depois das oito da noite, usando a porta dos fundos do hospital e ambos vestidos de branco. Entramos pelo estacionamento, que nessa hora está vazio, pegamos uma cadeira de rodas - há muitas na porta de trás do hospital -, subimos pelo elevador de macas e, sem dar satisfação a ninguém, vamos até o quarto, colocamos a velha na cadeira e nos mandamos. Tudo bem.

O plano saiu perfeito só que ao chegarem à saída dos fundos caiu uma tremenda chuva. E agora, a velha tá com pneumonia, como fazemos? Já que viemos até aqui, vamos levá-la de qualquer maneira, com pneumonia tripla e tudo. Assim, a mãe ensopada foi acomodada no carro, e a cadeira de rodas foi abandonada no passeio. Rindo muito do sucesso do mal-feito, eles se mandaram para casa. Lá, acomodaram a mãe na cama com todo cuidado e foram pitar um cigarrinho no quintal. A chuva já havia passado. Nisto, o diretor do hospital telefona comunicando o sumiço da paciente - coisa que nunca acontecera naquele hospital -, e informando que já haviam tomado todas as providências, enfim, que não se preocupassem, pois logo  tudo estaria resolvido etc., etc. O do telefone falou: Não se preocupe não, doutor, mamãe está conosco aqui em casa e até foi à padaria comprar uns pães pra servir com um cafezinho. O senhor aceita?

Belo Horizonte, outubro/2103.

 

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS

No mundo da mulher poucas naufragam de noite, muitas, ao amanhecer


Antonio Machado