sábado, 28 de julho de 2012

FOI-SE A MÃE DO BONECO DE PALHA

Pesaroso, tomei conhecimento, hoje, da morte da compositora e cantora Vera Brasil, também exímia violonista, professora de violão, autora de uma das mais delicadas canções da MPB. Ela gravou somente o LP “Tema do Boneco de Palha”, cuja canção muito nos encantou nos anos 1960.
Em meados de 1964, organizei em Ribeirão Preto um festival de bossa-nova intitulado “Bossa 1000”, que durante três noites movimentou o belíssimo Teatro Pedro II, na Praça Marechal Deodoro.  Na época, consegui juntar um elenco de craques - músicos de ponta, em São Paulo -, para as apresentações ao custo simbólico da entrada de “mil alguma coisa”, não me lembro da moeda na época; sei que era muito barato, talvez o equivalente a dez reais.
Entre os músicos convidados, vejam só, Paulinho Nogueira, Claudete Soares, Caetano Zama, violonista radicado nos Estados Unidos, Pedrinho Mattar trio, composto com os músicos Sabá no contra-baixo e Toninho Calça-curta na bateria, a banda  do maestro cego Manfredo Fest, Walter Santos e Tereza Souza, Geraldo Cunha e outros craques da época.
A convidada especial do evento foi Vera Brasil, a mãe do Boneco de Palha, que apresentou a música sendo ovacionada durante dez minutos pela plateia encantada.
Com um vasto repertório de mais de cem composições, a maioria delas inéditas, ela teve a canção Eu só queria ser, gravada por Elis Regina; a extraordinária Maysa gravou Menino desce o morro; o Jair Rodrigues, Inaê; e Elizete Cardoso, Canto de Partir. Ainda, o “Tema... foi gravado por Sivuca e teve um belíssimo solo arranjado pela extraordinária violonista Rosinha de Valença, que se tornou uma gravação clássica.
A notícia de sua morte informa que ela estava com 80 anos, havia quebrado a bacia e morava numa chácara em Araçoiaba da Serra, no interior de São Paulo.
Tenho certeza de que todos os bonecos de palha, espalhados pelo país afora, hoje devem estar muito tristes. E, numa singela homenagem póstuma, transcrevo a letra da música. Vejam que delicadeza. 

TEMA DO BONECO DE PALHA
Vera Brasil e Sivan Castelo Neto (pai dela)

Revendo antigos brinquedos
Dos velhos tempos de criança
Achei você, meu boneco de palha...
De sorriso pintado de esperança
E sem querer recordei
O pensamento remoçado
Os sonhos meus
Os desejos meus, esquecidos no passado.
Tristeza e alegria
Tudo aquilo que eu sentia no meu coração
Eu lhe contava assim e alimentava em mim a chama da ilusão, ilusão.
Revendo antigos brinquedos
Dos velhos tempos de criança
Guardei você, meu boneco de palha,
Para sempre na minha lembrança.

RHB - Belo Horizonte, julho/2012

domingo, 22 de julho de 2012

TO DRINK OR NOT TO DRINK, THAT`S THE QUESTION

Que encrenca essa agora! A gente passa a vida se comportando de forma até bem razoável, bebendo, fumando, etc. e tal e, de repente, o legislador decide sobre qual a quantidade mínima tolerável para se beber. Devo confessar que tenho entornado litros e litros de cerveja, whisky e vinho há mais de cinquenta anos e só me aconteceram poucos acidentes, apesar da bebedeira. Alguns ocorreram, é certo, porém, eu sempre estive sóbrio em todos eles. Com a cara cheia têm, até, alguns casos, bem pitorescos, sem acidentes, como no dia em que fomos almoçar no sítio do Eloy, na Pampulha, onde tomei diversos daqueles litros citados e preparei uma elogiada lasanha de bacalhau, uma das minhas especialidades. Na volta, o Eloy me pediu que trouxesse o garçom até o centro da cidade. O rapaz se aprontou e sentou-se apertado no banco de trás do Escort conversível, junto com o Pedro e o Frederico. A viagem transcorreu normal, até que, não sei por que, parei em frente ao Mineirão, puxei o freio de mão e continuei guiando, como se estivesse em pleno trânsito, porém, com o carro estacionado. Creio que deve ter sido por influência da música que estava tocando no som do carro: Big Yellow Taxi, maravilhosamente interpretada pela Joni Mitchel. Fiz questão de cantar com ela até o final. Eu vivo cantando no carro, mas não precisava parar e fingir que estava guiando só para desfrutar da música. É mania de músico frustrado e não de cachaceiro e demonstra bem o meu comportamento no trânsito, mesmo com a cara cheia. Até mesmo quando resolvo cantar ao volante, paro o carro e “no accidents at all.” O garçom, claro, pediu para descer no próximo ponto de ônibus e  saiu rápido e pálido.
Numa outra vez, capotei meu Gordini na estrada do Rio. Voltávamos de Itacoatiara, bela praia de Niterói, onde havíamos passado dez dias, com todos os litros e peixes disponíveis. Depois do almoço de um belo dia, quatro horas da tarde, resolvi voltar para Belo Horizonte. Fizemos as malas e partimos às seis e meia. Tudo bem até Congonhas, quando lá pela meia noite, sonolento, resolvi tirar uma soneca, acompanhando a Carminha, que estava dormindo encostada na porta apoiada num travesseiro. Saí da estrada, demos umas três cambalhotas e fomos cuspidos para fora do carro, então, totalmente destroçado. Conseguimos sair das ferragens, pegamos as malas espalhadas pela estrada e ganhamos uma carona num enorme caminhão vermelho. Desembarcamos uma hora depois em casa. Meno male. Vendi o Gordini para um ferro-velho, minha mulher passou um mês de cama com uma lesão na coluna, sem consequências graves, eu quebrei algumas costelas e cortei a cabeça em nove lugares, três em cada capotada.  Registre-se: não havia álcool nem no carro, pois, na época, só abastecíamos com gasolina e os carros ainda não tinham cintos de segurança. Uma lástima!
Ah! Alguns anos antes, papai viajou para São Paulo e, pela primeira vez, deixou o Mercury comigo. Fui levá-lo ao Aeroporto da Pampulha e fiquei motorizado somente por um dia, pois à noite, radiante, fui namorar na Cidade Jardim, seguindo despreocupado pela Av. Paraúna, hoje Getúlio Vargas, quando um amigo passou de carro do outro lado da avenida e abanou a mão me saudando. Cumprimentei-o efusivamente e enfiei o Mercury numa árvore, daquelas que ficavam no meio da rua. Foi uma batida e tanto. Amarrotei a frente do carrão e sentei-me chorando no passeio, pois não sabia como contar ao papai sobre o acidente. Ele adorava o Mercury, que ficou recolhido por seis meses numa funilaria, lá do bairro Prado.  Once, no alcohol at all.
Depois, certa manhã, quando tomei um táxi, indo jogar peteca na casa do Flávio, na Pampulha, um tresloucado, ao volante de um Ford, acertou-nos em frente à Churrascaria Fiesta Brava. Sem trocadilho, a coisa foi braba mesmo. Saí do ar por uns seis meses, devido a um traumatismo craniano, e só. Rinnovo: meno malle, anche. E até achei que ficar doido por seis meses foi até bom, pois, no período, aproveitei para refletir muito sobre o meu sobrevôo na Av. Antônio Caram, indo enfiar a cara num monte de terra da obra do Mineirinho. Só perdi uma jaqueta e passei uma temporada fora do ar, mas foi ótimo.  Sem álcool, novamente.
Não vejo, assim, nenhum motivo para parar de beber, pois nenhum daqueles acidentes ocorreu devido ao uso ou abuso do álcool. Todos aconteceram no meu estado de total sobriedade. Assim, “vamos a beber porque para no beber hay siglos...”
Roberto H. Brandão – 16/07/2008


FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS

Nem todas as verdades são para todos os ouvidos. Humberto Eco


domingo, 15 de julho de 2012

O quebra-dentes e a Luciana num passeio europeu. E ele continua sorrindo.

                                                    O QUEBRA-DENTES

Numa madrugada, recebi um telefonema do meu filho Pedro, queixando-se de que havia sido roubado, na porta da Boite L`Àpogée, na Savassi. Disse ele que estava aguardando na fila de entrada da boite, junto com o Brantinho, quando passou um bando de pivetes e um deles, com extrema maestria de larápio, arrancou-lhe o relógio do pulso e correu rua abaixo. O relógio não era lá essas coisas, não era de uma marca famosa, pois ele nunca ligou pra isso, mas, tudo que a gente perde ou é surrupiado ganha um valor enorme e torna-se uma grande perda. Era o caso, pois ele disparou atrás do ladrão que, cansado, um quarteirão à frente, resolveu enfrentá-lo.
Coitado! Ele não podia imaginar que tomaria um soco no rosto, que, impulsionado pela raiva, se transformaria num coice. O Pedro é muito forte e, com a pancada, arrancou-lhe, praticamente, todos os dentes, cegou-lhe um olho e abriu-lhe uma avenida na bochecha. O pivete caiu e o Pedro foi em cima pra pegar o relógio, mas, os outros do bando, talvez uns dez, que também estavam correndo juntos, se viraram contra ele tentando salvar o rapaz e afastar o enfurecido Pedro. Em desigualdade de condições ele, que não é bobo, desistiu momentaneamente do relógio e continuou sua corrida por mais uns dois quarteirões, quando a molecada desistiu de pegá-lo.
Pelo telefone, aconselhei-o a voltar para casa para esfriar a cabeça, prometendo que tomaríamos uma providência no dia seguinte. 
Quando chegou em casa ele me contou esta história, tomamos um bom gole de whisky e fomos dormir, pois já eram cinco horas da manhã.
No dia seguinte, um domingo, acordei matutando sobre o que deveríamos fazer ou que providência tomar, mas, não tive nenhuma idéia brilhante. O Frederico também acordou e troquei uma idéia com ele, mas, também, não chegamos a nenhuma conclusão.
Enfim, quando o Pedro se levantou, muito agitado e querendo fazer alguma coisa tive a idéia, prontamente aceita, de voltarmos ao local da pugna para procurar o relógio. Aventei a hipótese de que o dito cujo talvez tivesse caído da mão dele quando recebeu o petardo na cara e lá tinha ficado.
Animados, fomos, os três, atrás das pistas que nos levassem ao relógio roubado. Lá chegando, a um quarteirão da boite, munidos de umas sacolinhas, começamos a catar tudo que víamos no chão. E fomos juntando uns dez pedaços de dentes quebrados e dois inteiros - o Pedro abriu um sorriso. Encontramos todos os restos das noites e dias sem uma varrição como um rolo de papel higiênico sujo e pela metade, um pé de sapato que deveria ser do meliante, um bonezinho surrado, talvez dele também, vários botões de camisa que, com certeza voaram quando o Pedro tentava lhe agarrar e uma trilha de pingos de sangue indicando o caminho que o pivete havia tomado, quando fugiu. O Pedro sorriu de novo! Mais à frente, perto do portão de uma casa e num cantinho de muro, duas camisinhas usadas, um par de óculos sem lentes e com as hastes tortas, muitas folhas secas, dois copos de plástico, uma porca de roda de carro e um relógio: fodido, sem pulseira nem ponteiros e com o vidro quebrado. Não era o do Pedro!
Voltamos meio desapontados e só o Pedro com um sorrizinho maroto donde se deduzia: aquele pivete vai passar um bom tempo tomando sopa!
Roberto Hermeto Brandão
Belo Horizonte,12 de agosto de 2008 .

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
A gente pensa uma coisa. Diz outra. O ouvinte entende outra. E a coisa propriamente dita desconfia que não foi dita. Mário Quintana


quinta-feira, 12 de julho de 2012

O velho e o novo revisor, passeando na Afonso Pena, em frente à Igreja de São José, com a Lúcia, em 1947.
A HISTÓRIA SE REPETE

De vez em quando, nestas crônicas, cito meu avô Pedro Jorge Brandão Júnior, figura importante na minha vida, visto que morei com ele durante curto período quando papai, mamãe e Lúcia foram morar em Ribeirão Preto, em 1963. Durante seis meses habitamos juntos a casa dele na Rua Piauí, 1972, bairro Cruzeiro, em Belo Horizonte.
Morávamos, ele, 65, meu tio Heraldo, uns 32 e eu, 21. Quase três gerações num ambiente confortável e feliz.
O Heraldo, curiosamente, criava pombos e bichos da seda. Desenhista de traço perfeito cuidava dos bichinhos e cumpria seu expediente de examinador aos aspirantes à Carteira Nacional de Habilitação no Departamento Estadual do Trânsito. Sobre o Heraldo, ainda, quero falar muito mais, porém, nesta crônica, vou comentar sobre uma tremenda coincidência com a minha vida de hoje e a do meu querido avô.
Num instante, tornei-me revisor dos textos da AUDI, auditoria da EPAMIG, onde trabalho. Pela sensibilidade do chefe Márcio Matos, que, atento observador, descobriu um colega, escritor iniciante, que poderia ajudar na padronização dos escritos daquele departamento. Atualmente, a maioria das grandes empresas vêm mantendo em seus quadros um profissional dessa especialidade para oferecer aos leitores de seus documentos uma leitura mais fluida e agradável de documentos muitas vezes pesados e, porque não dizer, de leitura difícil pelo conteúdo indispensável de seus textos.
Coincidentemente, na década de 1930, meu avô Pedrinho, foi o primeiro revisor da Imprensa Oficial de Minas Gerais, emprego que atendia das oito da noite às quatro da madrugada, conferindo os textos do Diário Oficial, leitura enfadonha e cansativa de leis, decretos, portarias e circulares emitidas pelo Governo.
Tudo para compor uma renda suficiente para manter e alimentar uma prole de oito filhos, numa jornada que começava às sete da manhã nos Correios, como eles falavam.
São as voltas que a vida dá. Aliás, tenho feito revisões ao longo de toda minha vida, como diretor da Randrade e da Promar, agências de propaganda, onde não só criava os textos como também os copidescava para não passar nenhuma falha.
Digo isto porque, nesta nova função, muito me orgulho do trabalho a ser feito com prazer e desenvoltura, num ambiente francamente agradável com meus amigos da AUDI.
Muito obrigado, Márcio. Vamos em frente!
BH, outubro de 2011.

FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
"Mal por mal, é melhor ter o de Alzheimer que o de Parkinson, pois é melhor
esquecer de pagar a cerveja do que derramar tudo no chão."
Anônimo