O NOVO VERBO “CISCAR”
Minha avó Augusta
chamou-me e disse: “Roberto, pegue um pouco de milho lá na cozinha e jogue pras
galinhas. Elas estão ciscando muito”.
Cabreiro, peguei o
saco de milho e fui para o quintal. Logo, as galinhas, frangos, galos e pintinhos
foram me seguindo, enquanto eu distribuía o milho. Já conhecia aquela cena com
a vovó, meus tios ou a minha irmã Lúcia, que também costumavam tratar dos
bichos, quando estes ficavam picando o chão, descontroladamente, buscando uma
semente ou algum alimento entre os gravetos, ciscos, lixos etc. Aquilo sim a
gente sabia que era “ciscar”, ou seja, as aves limpavam o chão, catando a
própria refeição. Uma cena comum de antigamente, que acabou despertando a
criatividade das pessoas que, hoje, encontraram uma nova leitura para o verbo “ciscar”.
Caminhando na
praça, vejo pessoas assentadas nos bancos com o dedo indicador batendo sobre a
tela de seus telefones, tablets e
outras máquinas, no mesmo ritual das galinhas... ciscando. Alguns,
incontroláveis, vão caminhando e ciscando nos seus aparelhos; outros, aguardando
nos pontos de ônibus ciscando; dentro dos ônibus, passageiros também ciscando.
Quando retorno ao
prédio onde moro, o porteiro está ciscando sobre a mesa; a faxineira, encostada
com uma vassoura debaixo do braço, ciscando; o entregador de alguma encomenda
conversando com o atendente e ciscando; alguém esperando um morador, assentado
na poltrona, ciscando; o outro, esperando o elevador e ciscando.
É, acho que
voltamos à era das galinhas e vamos ciscar por muito tempo até que descubram
uma maneira dos olhos acionarem os comandos das máquinas. Será?
Belo Horizonte,
novembro 2015. Foto Google
FRASES, PENSAMENTOS E AFORISMOS
“Os cacos da vida
quando se juntam formam uma estranha xícara.” Carlos Drummond de Andrade